quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Sai a minha aba!


Nos últimos dois meses, toda vez que o telefone tocava na casa do aposentado Arnaldo Santos, ele resistia em atender. Santos recebia ligações de uma operadora telefônica pelo menos cinco vezes por dia, sempre com a mesma oferta. “Não agüentava mais; era uma insistência demasiada.” A filha dele, Andrea Montenarino, reclama da desorganização da empresa. “Será que só tem uma pessoa na lista deles, o dia todo?” A insistência na oferta, apesar de não contemplada pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC), agride a harmonia e o equilíbrio necessários à relação fornecedor-consumidor, que estão entre os princípios do CDC, e pode ser caracterizada como abusiva, alerta a advogada e professora de Direito Civil da Unibrasil, Rosalice Fidalgo Pinheiro.
“Quando o fornecedor se utiliza de uma prática que coloca o consumidor numa situação de desequilíbrio, nós temos uma lesão configurada”, explica Rosalice. Segundo ela, o “assédio” dos vendedores contraria o princípio da boa-fé, previsto no artigo 4 do CDC e que determina a conduta leal e equilibrada do fornecedor.
Para o especialista em vendas Dominic de Souza, a explicação para a insistência dos vendedores é a pressão por resultados. “A meta de vendas vem da presidência, mas quem tem de trazer o resultado é o vendedor. Ele é pressionado por todos os seus superiores e, por isso, acaba extrapolando a paciência do cliente”, explica Souza. Para o consultor, a insistência é, até certo ponto, parte das atribuições do vendedor, já que seu objetivo é buscar as necessidades do consumidor, para saber em qual delas o produto se encaixa.
O conselho de Souza para evitar “assédios” é que o cliente deixe bem claro quais são suas necessidades. “Quanto mais claro for o consumidor, menos o vendedor vai ter de perguntar. Se você está certo de sua necessidade, avise.” O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec) recomenda que os consumidores saibam dizer “não” quando quiserem pôr um fim aos excessos, já que a prática não configura uma penalidade prevista no CDC. “A empresa não está obrigando; só está oferecendo. É só dizer não”, informa a assessoria de imprensa da instituição.
Nos casos de telemarketing ativo, como o de Arnaldo Santos, já há em alguns países, segundo o Idec, legislações específicas para regular esses serviços, que estipulam horários e número de ligações permitidas por dia. Para a advogada Rosalice Pinheiro, da Unibrasil, uma legislação deste tipo seria bem-vinda no Brasil. “Isso deixaria o telemarketing mais regrado; haveria maior controle sob essas práticas. Eu mesma, numa época, já recebi muitas ligações que me deixavam irritada.” Arnaldo Santos, incomodado com a insistência da operadora telefônica, registrou suas reclamações na empresa. “Agora parece que esqueceram da gente. Ainda bem.”

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